Um por todos e todos por um
| 18 Jun, 2016

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Estão a ver quando uma série que começam a ver por acaso se torna numa das vossas favoritas? E nem é aquelas da “moda”, como Game of Thrones, The Walking Dead  ou Arrow, mas uma série com orçamento baixo e uma adaptação de uma obra que já teve o mesmo tratamento vezes sem conta. The Musketeers chegou aos pequenos ecrãs em Janeiro de 2014 e foi a primeira review de um episódio piloto que redigi para o Séries da TV a pedido dos meus chefões! Para além de ter sido a minha estreia, foi praticamente das únicas que continuei a ver. Porquê? Bom, acho que vou descobrir à medida que a crónica se for desenrolando!

Os Três Mosqueteiros é um clássico da literatura francesa e mundial, da autoria de Alexandre Dumas. Tinha visto há pouco tempo a última adaptação cinematográfica (Os Três Mosqueteiros de 2011, estrelado por Logan Lerman, Matthew Macfayden, Luke Evans, Ray Stevenson e Milla Jovovich) e fiquei meio desencantada com o tom meio ridículo e superficial da película.

Como tal, o tom mais sério dado às séries da BBC despertou-me logo a atenção. Sou adepta de séries que sejam verdadeiras às suas personagens,

O elenco foi muito, muito bem escolhido. Tom Burke conseguia transmitir perfeitamente o espírito torturado do seu Athos. Não considero o ator muito carismático (apesar de admitir que nunca o vi noutro registo), daí ser tão bom no papel do mosqueteiro. Já Santiago Cabrera consegue usar o seu encanto latino para nos deixar babad@s com o seu romântico e adorável Aramis. Luke Pasqualino ficou conhecido pelo seu papel trágico em Skins, mas ele entrou tão bem na pele do jovem d’Artagnan que nos fez esquecer o adolescente problemático. Já Howard Charles teve a vida mais fácil com o seu Porthos, que é o mosqueteiro menos carismático do quarteto, mas que fez bem o seu trabalho e nos conquistou com as suas piadas e com a revolta com a diferença tão abismal de classes na França do século XVII.

A química que existe entre os quatro mosqueteiros fez com que me apaixonasse pela série logo nos primeiros episódios. Em termos de personalidade, os quatro homens não podiam ser mais diferentes nem as origens de cada um (Athos é conde, D’Artagnan filho de um agricultor, a mãe de Aramis era prostituta e passou os primeiros anos de vida num bordel e Porthos era filho de uma escrava em fuga), mas o forte sentido de justiça e honra na defesa do rei e do seu país (mesmo quando ambas as tarefas acabem por chocar muito, o dilema é apresentado várias vezes) uniu os quatro e vai construindo a amizade ao longo das três temporadas. “Um por todos e todos por um” nunca foi um lema tão bem empregue.

A série tem mais força com as personagens secundárias, que foram ganhando o destaque merecido, especialmente as mulheres. Sim, D’Artagnan, Porthos, Aramis e Athos são o centro da série, mas a série teria metade da qualidade se não fosse pelos seus companheiros de cena. Especialmente os interesses amorosos dos nossos heróis. Constance Bonacieux. Milady de Winter. A Rainha Anne. Sylvie. Estas três beldades deixam os corações dos corajosos mosqueteiros a palpitar, mas os produtores Adrian Hodges e Jessica Pope não quiseram que elas fossem apenas um adereço para dar um tom romântico à série. Milady de Winter era a mulher de Athos, que ele alegadamente enforcou por ter morto o seu irmão mais velho e uma das vilãs do livro e da série. Ela sempre assumiu o papel feminino principal e Maimie McCoy desempenhou na perfeição a vilã que tinha muito mais nela do que uma assassina de sangue frio, tornando assim Milady (ou Anne, o seu nome verdadeiro) a personagem mais complexa de toda a série. Foi uma pena que a atriz tenha tido um papel tão pequeno na terceira temporada devido à gravidez. Milady ainda tinha muito para dar. Já Constance, nos livros, é uma das damas de companhia da rainha, mas na série começa por ser uma dona de casa que dá guarida a D’Artagnan após um encontro atribulado. Constance é a maior mudança dos livros. Tem um papel maior e é mais do que uma donzela em apuros. É uma mulher forte e determinada, corajosa e apaixonada que mesmo com o facto de estar presa a um casamento sem amor não se deixa ir abaixo. É através de D’Artagnan que consegue abrir mais as asas. D’Artagnan compreende-a e aceita-a como é. Sylvie aparece apenas na terceira temporada para preencher o lugar vago deixado por Milady, mas dá a oportunidade à série de mostrar mais a voz do povo pobre e descontente de Paris que foi severamente afetado pela guerra Franco-espanhola. Sylvie é uma mulher que não se conforma com a abismal diferença de classes e a falta de oportunidades dos mais desfavorecidos. Por fim, a rainha mostra-nos o lado negro de uma vida privilegiada. Anne é irmã do Rei Filipe III de Espanha e Portugal. Casou-se cedo com Louis e, apesar de os dois serem os melhores amigos, nunca houve amor. Para piorar a situação de Anne, a sua nacionalidade espanhola era motivo de nunca ter sido verdadeiramente apreciada nem amada tanto pelo povo como na corte. Uma mulher que tem tudo acabou por ser a mais solitária de toda a Paris.

Peter Capaldi deu vida ao icónico Cardeal Richelieu, o primeiro-ministro e homem de confiança do rei. O que tornou o Cardeal o melhor vilão de toda a série (os seguintes eram bons, mas demasiado vilões estereotipados para superarem o Cardeal) era ele querer sempre o que era melhor para o país, mas depois andava sempre deserto de desmantelar os homens que protegiam o mesmo. Fiquei com imensa pena que Capaldi tenha sido chamado para Doctor Who. Ninguém conseguia ser mais dissimulado e fabuloso como ele. Eterna saudade.

Por último, quero destacar o rei Louis XIII. Se havia personagem que me conhecia fazer rir às gargalhadas era o monarca. Uma criança grande com uma coroa na cabeça só não destrói um país quando tem pessoas com dois dedos de testa à sua volta. Foi o que aconteceu. Louis era um rei fraco e facilmente influenciável (o que se revelou desastroso na segunda temporada). Era um homem que tinha uma esposa dedicada e esperta que não sabia valorizar devidamente e, como resultado disso, viu-se com um herdeiro bastardo nos braços que acabou por ser o rei mais poderoso da monarquia francesa. Irónico, não é?

Agora que releio a “verborreia” sobre o meu amor por esta série concluo que não são precisos efeitos especiais nem nomes de peso ou reviravoltas e mortes surpreendentes para fazer uma boa série. Eu vi uma história que se passava no século XVII a ter semelhanças com os dias de hoje. Há coisas que, infelizmente, são intemporais. Nem todos temos as mesma oportunidades, ainda existem os que “são filhos e outros são enteados”, o racismo e abuso de poder, as consequências de uma guerra, os refugiados, a violência doméstica! Apesar de os tempos estarem a mudar, as palavras de Constance para D’Artagnan no início da segunda temporada ainda têm o seu quê de verdade: “Eu sou uma mulher, D’Artagnan. Sou uma mulher num mundo feito para homens”. Podemos ter telemóveis topo de gama e meios de transporte que não sejam cavalos, mas as pessoas não são assim tão diferentes.

The Musketeers terminou com a sua terceira temporada e senti uma espécie de vazio que não sinto em todas as séries que acompanho do início ao fim. É uma série especial, que fica. Não costumo fazer maratonas de séries que já vi, mas esta será das poucas pela quais estarei disposta a abrir uma exceção. Isso já ninguém me tira!

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