The Walking Dead: In memoriam
| 29 Out, 2016

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**Contém spoilers**

“Aposto que pensaste que iam envelhecer juntos, sentados à volta da mesa para o jantar de Domingo e felizes para sempre.”

Será que pensámos? Será que por um momento louco achamos que as próximas provações de Rick e companhia seriam a tentativa de conciliação de assuntos mundanos com os walkers? Será que por um segundo inexplicável imaginamos o Glenn e a Maggie não com um, nem dois, mas três pequenos à volta, tão apaixonados como no primeiro beijo? Será que nos atrevemos a acreditar que o Rick iria reconstruir a sua família ao lado de Michonne? Será que fomos tolos por acreditar que algo de verdadeiramente bom ia acontecer aos nossos sobreviventes favoritos?

A resposta às nossas preces não chegou e foi no último domingo que dissemos adeus a duas personagens bastante queridas do público. Abraham – que parecia ter encontrado um novo propósito na vida depois da morte da mulher e dos filhos, que tinha reatado a sua amizade com Eugene e que parecia pronto para uma vida feliz ao lado de Sasha – foi a primeira vítima de Lucille. É claro que ele não podia ter ido de maneira mais honrada: queixo erguido, dois dedos erguidos em cumprimento a Sasha e umas últimas palavras bastante rudes (mas memoráveis) para o seu carrasco.

Quando finalmente respiramos fundo e pensamos que Negan ia dar mais umas palavras e deixar a cena, vemos uma das personagens mais acarinhadas de The Walking Dead sofrer uma morte brutal. Por uns segundos tive de parar o episódio e respirar fundo. Não que eu não esperasse: as suspeitas, as apostas, as teorias e até as bandas desenhadas apontavam para isto. Por um segundo revi todos os momentos de Glenn: o jovem que se encolhia ao som de Merle Dixon; o desastrado que derrubou os preservativos, mas encantou Maggie; o sonhador que arriscou amar e casar, mesmo quando existem cadáveres a tentar comer-te; o vencedor que é torturado, mas que se recusa a denunciar o seu grupo; o lutador que percorre quilómetros para encontrar a mulher que ama; o corajoso que viu amigos perderem a vida da maneira mais dura; até finalmente ser o homem que enfrenta a morte. “Maggie, I’ll… I’ll find you” são as palavras que nos irão assombrar durante as próximas temporadas.

E o pior de tudo? O silêncio que segue ambas as mortes. Sem escândalo, sem gritos. Para quê chamar por quem não nos ouve quando a nossa vida depende disso? Mas foram as lágrimas silenciosas de quem assistia com os gritos de dor presos na garganta que tornaram aqueles momentos agoniantes. Também as memórias de Rick são um factor de stress bastante grande. A cada uma percebemos que aquele grupo de pessoas que se uniu por circunstâncias do destino se tornou numa família.

Mas foi apenas mais tarde, bem no fim do episódio, que percebi todo o poder desta estreia. Quando Negan tenta que Rick corte o braço do próprio filho em troca da vida de todos os outros e, no meio de desespero e de todos aqueles gritos de cortar a respiração do líder, Carl calmamente aceita o seu destino. O que aconteceu àquele pirralho mimado que roubava as armas de Daryl e fugia deixando toda a gente em pânico? O que aconteceu ao fedelho que era a causa indireta de metade das desgraças que aconteciam? Quando foi que Carl se tornou num jovem maduro e racional? Foi aí que comecei verdadeiramente a chorar. Um rapaz de 14 anos compreende que um braço é insignificante comparado com as vidas daquelas pessoas. Um adolescente que já perdeu a mãe, o olho e vários amigos pelo caminho está disposto a sacrificar uma parte do seu corpo por outros. Aí percebi: o Carl já não é aquela personagem detestável das primeiras três temporadas, mas sim um dos mais fortes, um dos mais lutadores, um dos que mais cresceu. E, nesse momento, o meu peito aqueceu-se com carinho ao vê-lo abraçar Maggie, a tentar aplacar a sua dor.

Quarenta e cinco minutos depois é que finalmente percebi. Isto não foi o início. Isto foi o fim. O fim da inocência macabra de The Walking Dead. Até agora, o grupo de Rick teve a vida facilitada. O Governador, Gareth, Dawn, os Wolves… tudo brincadeira de criança. Tudo uma sombra daquele que é o verdadeiro vilão. Negan não tem medo, não tem remorsos, não tem nada a perder. Se acabar com Alexandria, ele encontrará outra fonte de suplementos. Se matar Rick, ele substitui-o por outro. Se ele destruir a sanidade de cada um deles… bem, o problema não é exatamente dele.

Já faz umas temporadas que Rick percebeu onde reside o verdadeiro perigo, mas e nós, os fãs? Será que tínhamos percebido a extensão da ameaça? Ou até mesmo qual é esta? Os humanos são os verdadeiros vilões desta série, os zombies apenas um despiste e Negan chegou para nos mostrar isso.

Outra questão que ficou na minha mente: porquê levar o Daryl? Para ter um trunfo? Porque não uma das mulheres? Para quê levar alguém que irá dar luta? Para mais uns jogos mentais com Rick? Para o poder manipular? Para o transformar em mais um dos seus soldados? Não será fácil, pois ficou bem claro que Daryl não é grande fã de Negan. Além da morte de Abraham, por quem Daryl tinha bastante respeito, também Glenn perdeu a vida e, apesar de os dois terem começado com o pé errado, ainda durante a primeira temporada, ambos se tornaram amigos e companheiros. Será este o verdadeiro teste ao laço que une Daryl a Rick e ao grupo? Como será que Rick irá aguentar sem o seu eterno conselheiro? E como será o reencontro entre Daryl e Maggie? Não nos podemos esquecer que foram as atitudes violentas e impulsivas do nosso caçador favorito que levaram à morte de Glenn. E se nós não nos esquecemos, a Maggie não esquece de certeza.

Apesar de todas as críticas a este episódio, não posso deixar de discordar da maioria. Este foi, na minha opinião, um dos melhores episódios de The Walking Dead. Às vezes a série não é apenas aquilo que vemos no ecrã, mas aquilo que lemos entre frames. Um olhar, um gesto, um momento que pode fazer toda a diferença de como vemos a temporada inteira.

Este “In memoriam” não é apenas pelo Glenn e pelo Abraham. É por tudo aquilo que vem. É por todas as vítimas de Negan. É pelo filho de Maggie e Glenn que não vai conhecer o pai. É pelo amor de Sasha e Abraham que nunca vai ganhar asas. É pela infantilidade de Carl que ficou duas temporadas atrás. É pelos dias em que acreditamos que o Governador era a pior coisa que podia acontecer. É pelos jantares de domingo que nunca vão acontecer.

Beatriz Pinto

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