O poder do diálogo em Suits
| 12 Mar, 2016

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Há séries que vivem da surpresa, outras que nos conquistam pela sensibilidade do argumento, outras pelos efeitos especiais ou pelas explosões abundantes e outras pelas suas personagens fantásticas. Mas há uma, em particular, que se destaca na era dourada da televisão e a qual não tem a atenção merecida. Uma que é esquecida pelas cerimónias de prémios conceituadas, uma que poucos se lembram quando estabelecem um top das suas séries favoritas. Esta série chama-se Suits.

Suits conta a história de Harvey Specter (Gabriel Macht), advogado presunçoso e de língua afiada, que trabalha para a conceituada empresa Pearson Hardman, em Nova Iorque. Harvey é conhecido por nunca ter perdido um caso, mas precisa de recrutar sangue novo para os quadros da empresa. Mike Ross (Patrick J. Adams) ganha uns trocos ao fazer recados na sua bicicleta e em tomar o lugar de alunos frustrados nos exames, tirando proveito da sua memória fotográfica. O jovem vive com o seu amigo de infância Trevor num apartamento pequeno e luta para conseguir arranjar fundos para pagar a renda. Nisto, Ross resolve infiltrar-se na proposta de um estágio na firma Pearson Hardman e é aí que conhece Harvey, que não prescinde de um franzir de sobrancelha em encontrar um novo aprendiz com tanto talento.

A premissa simplória de Suits alia-se a um altruísmo e egoísmo típico da profissão em que se foca. Juntando-se à dupla fantástica, temos Donna Paulsen (Sarah Rafferty), a secretária de Harvey que tem sempre uma resposta na ponta da língua; Rachel Zane (Meghan Markle), a solicitadora que ajuda nos casos e que, mais tarde, virá a tornar-se num dos focos amorosos da série; Jessica Pearson (Gina Torres), a manda-chuva da empresa, e ainda Louis Litt (Rick Hoffman), o emocional e explosivo rival de Harvey. Estas personagens ajudam a adornar a narrativa de Suits, ao equilibrar um misto de humor subtil e versátil com a criação de uma história plausível e que preenche os requisitos normais de uma série aparentemente leve.

Criada por Aaron Korsh em 2011, Suits é uma série prodigiosa. Uma série que não precisa de grandes artífices na sua construção, mas que tira proveito do brilhantismo de um argumento feroz e ambicioso. Atualmente na sua 5.ª temporada (a renovação para 6.ª já foi confirmada), “Defesa à Medida”, como é conhecida em Portugal, foi caminhando para um prestígio pouco reconhecido entre os grandes apreciadores de televisão.

O certo é que, mesmo aqueles (como eu) que não estão por dentro das burocracias da advocacia, não deixam de viver com intensidade o que é dito, ainda que muito lhes passe ao lado. Aqueles que estão confortáveis na temática sabem que o elemento ficcional ajuda a um embelezamento dos diálogos, mas sabem dar a “mão à palmatória” da veracidade com que se joga com a terminologia técnica do ofício.

Em Suits, as armas de ataque mais eficazes são as palavras. Não há efeitos especiais, nem ideias megalómanas de estratégia. Apenas assistimos aos melhores dos melhores a fazer aquilo que sabem fazer melhor. A série bebe de uma intensidade atípica que nos mantém em constante atenção. É caso para dizer que eles muito falam, mas agarram-nos do início ao fim. Porquê? A resposta é simples: porque Suits constrói as suas personagens de forma gradual ao mesmo tempo que vai trabalhando o enredo com um dramatismo fugaz, intercalando com uma injeção de “normalidade” (como os valores humanos do amor e da amizade) e vai respondendo às necessidades dos seus fãs, bem como serve de resposta às falhas intrínsecas da banalidade da sua premissa.

Com isto, é caso para dizer que Suits conquista. Tem os twists dignos de um How to Get Away with Murder (que, note-se, é mais recente), tem um romance que fará inveja a Nicholas Sparks por ser trabalhado com simplicidade, tem a “lábia” de A Few Good Men, mas não a usa para um tom pesado, tem um carisma particular ao colocar dois homens charmosos e talentosos a encabeçar a história e figuras femininas de força que usam a sua beleza física e intelectual para equilibrar a dose de machismo. Mas, acima de tudo, é um exercício de televisão que vai reciclando a sua história de maneira a enriquecer o espectador com uma necessidade de aprender mais sobre a área, mais sobre o que é ascender na carreira, o que é estar-se no limite e saber contornar as opções.

E se este artigo não vos convencer a ver a série, lembrem-se pelo menos que vão “devorar” estas temporadas e nem vão dar conta do tempo passar. Posto isto, acham que a série não merece a atenção dos grandes estúdios? Se os Emmys respeitassem a categoria de Melhor Argumento Original, Suits seria o eterno vencedor, ainda que as nomeações passem ao lado. Vestir-se com fato e gravata passou de moda a conceito, de aparência a uniforme. Se um soldado veste um colete de Kevlar para estar à prova de bala, um advogado veste-se de forma clássica para exigir o respeito que merece. Se a lei funciona como um conjunto de regras, então há sempre alguém que as domina e que encontra sempre um pretexto para defender/ acusar quem as quebra.

Suits brilha pela simplicidade do seu enredo, mas ganha pelo ritmo extraordinário com que constrói os seus diálogos, como desenvolve as suas personagens e como adiciona surpresas inesquecíveis. E é aqui que o meu conselho humilde surge: vejam, viciem-se e deliciem-se!

Jorge Lestre

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