Dogs of Berlin – Review da 1.ª Temporada
| 22 Dez, 2018

Publicidade

Temporada: 1

Número de episódios: 10

Dogs of Berlin acabou de se tornar numa das minhas séries alemãs preferidas.

A série da Netflix acompanha a investigação do homicídio de um jogador turco da seleção alemã, Orkan Erdem. Dois polícias com feitios muito diferentes um do outro são obrigados a trabalhar juntos quando são destacados para chefiar a comissão especial Cartão Vermelho, que irá investigar a morte do futebolista. A série vai mostrar o lado mais negro da cidade de Berlim, onde clãs e gangues de várias nacionalidades vivem de negócios ilegais e disputas entre si.

Como já tinha referido na review do piloto, tenho um grande fascínio pela Alemanha e estava com muitas expectativas para esta nova aposta da Netflix. Dark já tinha surpreendido pela positiva, revelando-se uma das melhores apostas que vi no ano passado, mas admito que na primeira metade da série me perguntei várias vezes “aonde é que querem chegar com isto?”. Já Dogs of Berlin agarrou-me logo desde o primeiro episódio, coisa que não estava à espera que acontecesse, porque este género de série não é dos meus preferidos.

Apesar de a história andar à volta do homicídio de Orkan Erdem, não é a resolução do caso que mais prende, mas sim a intriga toda que acontece à volta disso. Temos clãs a reclamarem o seu território, guerras entre irmãos, polícias corruptos, dependências de drogas e álcool, traição, homossexualidade… Tudo na dose devida. As várias narrativas paralelas que acompanham a premissa principal da série vão-se desenvolvendo de uma forma fluída, complementando-se umas às outras, ajudando-nos a perceber melhor o modo de agir de algumas personagens.

Ao contrário de Kurt, que é um polícia corrupto, vindo de uma família e com antecedentes neo-nazis, Erol Birkan é o seu oposto, um polícia cujo objetivo é fazer cumprir a justiça e fazê-lo segundo as regras. Daí que só quando se vê diretamente atacado pelo clã Tarik-Amir é que decide aliar-se a Kurt para os apanharem. Gostei bastante da mensagem que esta personagem transmite. Erol é um polícia, mas é, acima de tudo, um polícia que admite ter medo. Muitas são as vezes em que vemos, quer seja em séries ou em filmes, os polícia a serem retratados como pessoas destemidas e sem medo de enfrentarem o inimigo, aqui não. Vemos um homem comum que “anda atrás dos maus da fita”, mas que demonstra as suas fraquezas e os seus medos. A cena em que ele se está a preparar para entrar na zona proibida a polícias para ir procurar o Canberk é um bom exemplo disso, assim como quando o admite a Rafika, quando está no hospital com ela. Outra característica importante na personagem é a sua homossexualidade. A cultura muçulmana vê a homossexualidade como um pecado e o pai de Erol ainda é um desses conservadores (como acontece ainda com muitos turcos), logo é visível a grande barreira que existe entre os dois. A crença religiosa do pai de Erol não só o separa a ele do filho, como também do resto da família, principalmente da sua esposa, que vive num clima de medo constante, com receio que o marido apareça em casa dela.

A cena final dos dois (filho e pai) em casa de Erol foi muito bem escrita e muito bem representada pelos dois atores. Não me lembro de ver nenhuma série em que uma personagem masculina homossexual fosse representada como Erol. Não há nada nele que indique, à primeira vista, que é homossexual, nada do que ele faz demonstra isso, não há cá tiques nem guarda-roupa para dar umas pistas, sabemos que ele é homossexual porque é-nos dito. Esta é uma questão pertinente, porque os gays não são todos efeminados e é importante que a comunidade LGBTQ+ tenha alguém como Erol a representá-los. Apesar de não ter achado a prestação de Fahri Yardim brilhante, nos momentos mais emocionantes conseguiu captar a essência das situações e transmiti-los ao público.

Na review do piloto, tinha demonstrado vontade em ver a questão da comunidade turca aqui retratada. Apesar de não o terem feito como estava à espera, não se tendo focado somente nela, foram-nos apresentados vários clãs, de várias nacionalidades, muito fechados entre si. Se repararmos, os turcos dão-se com os turcos, os jugoslavos com os jugoslavos e por aí em diante. Esta é uma realidade que a Alemanha tem vindo a testemunhar desde já há algum tempo e é um fator que ajuda ao desenvolvimento das sociedades paralelas, que também são retratadas na série.

A Irmandade Marzahn representa um grupo de neonazis que defende uma Alemanha “limpa”, ou seja, seguem a mesma ideologia de Hitler, em que a raça ariana é uma raça superior. Há um discurso do líder da irmandade, no episódio 8, em que são claras as parecenças com o Führer. A forma de falar está muitíssimo parecida à forma como Hitler falava nos seus discursos. Este é mais um tema premente, tendo em conta a ascensão crescente de grupos de extrema-direita nos dias de hoje.

A personagem Bine continuou a surpreender ao longo de toda a série. Interpretada pela belíssima Anna Maria Mühe, a já premiada atriz teve um desempenho formidável, ainda mais se tivermos em conta que a personagem não tem nada que ver com ela, como a própria já afirmou. Esta personagem tão problemática que é a de Sabine consegue prender a atenção ao longo de toda a narrativa.

Paula também é uma personagem muito estranha (pegando nas palavras de Murathan). Ao longo da série, os sentimentos que sente em relação a Kurt vão-se baralhando e ela não sabe bem o que fazer nem como lidar com eles, uma vez que o marido parece cada vez mais distante e ela não consegue arranjar maneira de alterar isso.

Com um elenco com prestações muito sólidas, um dos atores que se destacou e eu desconhecia era Sinan Farhanmehr (Sinan-G), que interpreta Hakim Tarik-Amir. Vi a série toda e achei que o ator tinha feito um trabalho excelente com o personagem. Qual é o meu espanto quando vou ver quem é e percebo que o “ator” não é ator. Sinan foi escolhido para o papel por ter tido um passado parecido ao da personagem e ter feito uma audição que provou que ele era a pessoa certa para desempenhar o líder do clã Tarik-Amir.

Em termos de casting, só não gostei do miúdo escolhido para fazer de filho de Paula e de Kurt Grimmer. Sei que é uma criança, mas já vi miúdos terem um desempenho muito melhor do que ele.

Se formos entrar em pormenores, houve duas cenas (para além da que já mencionei no piloto) que me pareceram irreais: Murad nunca conseguiria ter passado tantas janelas do prédio e entrar na do vizinho e sair pela porta da casa deste sem ter caído ou ser visto. E se a janela estivesse fechada? Bine não conseguiria ter ficado tanto tempo pendurada da janela. Ela teria escorregado quase imediatamente pela forma como estava a agarrar o parapeito. Também achei o ferimento demasiado exagerado. Se ela tivesse realmente aquele ferimento, não conseguiria andar logo no dia a seguir, estando apenas a coxear. Também não sou grande fã de quando acrescentam falas gravadas em estúdio, pois há alturas em que parecem mesmo “artificiais”. Nesta série, aconteceu poucas vezes, mas é algo que noto sempre e me incomoda, porque estão demasiado “limpas”. Não sei se também sentem o mesmo ou se sou eu que dou demasiada importância a pormenores. O episódio 3 foi talvez o que menos gostei por causa do jogo (cenas do relvado e efeitos especiais), de resto estiveram todos os episódios quase ao mesmo nível.

Outro dos pontos altos da série é também a banda sonora. Não sou fã de rap, mas fiquei fã de algumas músicas que passaram, principalmente as dos créditos do episódio 4 e 6. Estas músicas foram feitas de propósito para a série e, tal como as restantes, complementam a narrativa.

O que é que posso dizer mais sobre a série? Vejam! A meu ver, é, sem dúvida, uma das produções do ano. A realização e o argumento estão muitos bons, os atores estiveram à altura do desafio e a equipa que tratou da fotografia também está de parabéns. A narrativa desenvolve-se de forma fluída por entre as várias histórias. O autor do homicídio do Orkan Erdem também é inesperado. Aposto que ninguém adivinhou quem era o assassino.

Melhor episódio:

Episódio 10  Foi difícil escolher um episódio que se destacasse, mas depois de uma disputa com o episódio 8, decide escolher o episódio 10, o final. Escolhi o episódio por causa de toda a sequência da polícia na zona proibida, destacando a sequência em que a polícia já está dentro do prédio do clã. Uma peça de realização magnífica! Acrescentando a isto a conversa emocional entre Erol e o pai e a cena final na loja de Paula, penso que é um episódio que se consegue destacar um bocadinho dos outros, pois o nível de qualidade esteve sempre presente.

Personagem de destaque:

Kurt Grimmer (Felix Kramer) Estive para escolher Bine, mas Kurt levou a melhor. Não lhe fiz grande referência na análise acima, para a fazer aqui. Kurt é, sem dúvida, um personagem complexo e com uma inteligência acima da média. É impressionante ver como consegue sair sempre por cima em todas as situações. Teve um passado neo-nazi (ainda se debate com ele, pois a família ainda se encontra na irmandade), é um polícia corrupto, mas mesmo assim quer ajudar a sociedade (à sua maneira). Tem um caso com uma ex-namorada da escola, mas não consegue deixar a mulher, porque esta foi o seu pilar quando decidiu romper com as suas ligações ao neonazismo. É um personagem que nos deixou a pensar: como é que ele vai abordar a questão deixada em suspenso no final da temporada?

Cláudia Bilé

Publicidade

Populares

calendário estreias posters maio 2024

dead boy detectives poster netflix pt

Recomendamos